quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Mais uma madrugada acordado...

Mais uma madrugada acordado... Estou em casa... Cansado... Não consigo dormir... O que tem se tornado um costume... Deitado na cama eu olho para o teto... Vejo pequenos defeitos na pintura e algumas teias de aranha, que se acumulam... Na cabeça, vagos pensamentos... Coisas grandes e pequenas, inúteis e relevantes, importantes, mas ao mesmo tempo vazias...

Reviro na cama e entre os lençóis percebo que não estou só... Ela está comigo... Novamente... Presente já ha algum tempo... Não consigo me lembrar ao certo desde quando... Culpada da minha insônia recorrente... Insistente... Ao meu lado na cama... A Solidão... Companhia inesperada, soube impor sua presença... Goela abaixo, fui obrigado a aceitá-la...

A solidão é como as mulheres, queria “apenas” ser minha amiga... Chegou falante e “enturmando”... Se “abriu” comigo... Com pouco tempo estávamos íntimos... Não tínhamos tanta coisa assim em comum... Mas, inconscientemente ressalto demais sua importância, engrandeço demais o seu ego... O suficiente para que ela não queira mais abrir mão de nossa “amizade”...

Levanto da cama e vou ao banheiro... Ela vem comigo... O problema da solidão é esse... Nunca me dá espaço... Não “desgruda”... Sufoca... Quero fugir dela... Mas como ignorá-la? Ela “força a amizade”... Ocupa muito espaço... Chama atenção demais... Demanda muito esforço silenciá-la... Sou vencido pelo cansaço... E volto pra cama calado...

Então meu mundo é nada mais, que o silêncio do meu quarto... Pensando... Só lamento ter tanto a dizer... Coisas que a solidão não merece ouvir... Tantos sentimentos guardados, tão bonitos... Tão vivos, embora amargurados... Coisa de romance... Mas isso não existe não é? Ela falou que isso é coisa de menina esperando o príncipe encantado... “Cortou meu barato”... A solidão sabe ser “um saco“...

Ligo o rádio... Mesmo sabendo que a música da madrugada não pode se juntar com a solidão... Elas são velhas conhecidas... Ai, até que colocam a “conversa em dia”, torturam minhas lembranças... Sou o assunto delas... Tocam todas as minhas feridas... Depois, com “pena”, até tentam me consolar... Passam a mão na minha cabeça e me afagam... Dizem que eu não estou tão só... Que ainda tenho a elas... Então por um momento eu durmo... Abraçado pela solidão e ninado pelo som da minha própria angústia...

Dormir com a solidão não é fácil... Não é sono profundo... É sono leve... Qualquer coisa incomoda... Qualquer “sonhozinho”... Um “planejamentozinho” que seja e ela já me acorda... “Nem sonhando” ela dá paz... Acordo sobressaltado... Mas não é pesadelo, é realidade... Então ela sorri de forma discreta... Risada maldosa... Maquiavélica... Tenta esconder a satisfação que lhe causa o meu estado... Ela é egoísta... Só pensa nela mesma... Consegue curtir meu sofrimento... Pra ela está ótimo assim...

Escuto um barulho na rua... Carros passando como passa a vida... E como é curta pra ser feliz... Mas também longa e insípida para quem se frustra... Toda espera se torna uma eternidade... Tudo demora... Tudo é difícil... Não tem luz no fim do túnel, não tem pote de ouro no final do arco-íris... Não tem “jeitinho brasileiro”... Tenho que me conformar com os trâmites, com a burocracia da vida... Assim, a solidão afeta minha noção de tempo... Não me deixa “furar a fila”... Nem mesmo por algumas horas... Estendendo a madrugada...

Ligo a TV... Então lembro que há tempos não saio... Como os seriados, a solidão é vampira... Suga toda minha sociabilidade... Ela me desconcentra... Mesmo em comunidade... De repente me comporto de uma forma que nem percebo... Sou “seco”, “fechado”... As pessoas interpretam como “grosso” e mal-educado... Crio um estereótipo... Pelo menos é o que sempre me falam... Não foi minha intenção... Agora é tarde... Já fui vampirizado... E mesmo em meio à muita gente, fico a sós com a solidão...

Vou até a geladeira... Brindo à solidão com refrigerante... Velho, já tinha sido aberto... Sem gás... Sem gosto... Desgosto... O que a pouco tinha tanto gosto... E era tão bom... Recém aberto, recém descoberto, a ser desfrutado, servido apenas num único copo... Cheio de gás... Aberto pela gula de quem não queria ser saciado... Ou pela luxúria, que não se basta com uma bebida tão comum... Desperdiçado... Apesar de gelado, já não borbulha mais... Ninguém mais quer beber... Gosto de rejeição, a gosto da solidão...

Volto pro quarto novamente... Estou farto da solidão... Brigo com ela! Grito! Mas ela não se ofende... Não liga e não vai embora assim tão fácil... Ela sabe que depois da queda, ainda vem o coice... Sabe que se perde o amor e o encanto... E que os amigos se vão em seguida... Sabe que um “deslocado”, não se encaixa em nenhum meio... Que se torna indesejável, causando constrangimento... Assim, “faço fama, sem nunca ter deitado na cama”... Viro assunto sem graça, “fofoca batida”, “baixo astral”... A solidão é estrategista...

O sol já está quase nascendo... A solidão não gosta de ver o dia clarear... Ela é soturna... Azeda o seu dia, mas trabalha às escuras... Tenho mais um dia pra tentar me livrar dela... Mas, vai ser preciso tanto esforço... Tanta exposição... Tantas mudanças... Correr o risco de uma nova desilusão... O que pode ser pior do que ter que passar outra madrugada com ela... Será que é tão ruim assim? “Antes só do que mal acompanhado”... Palavras do maior de todos os solitários...

Mais uma madrugada acordado... O dia já está claro... Estou em casa... Cansado... Agora a solidão vai me deixar dormir... Algumas poucas horas... Deitado na cama eu olho para o teto... Daqui a pouco preciso estar de pé... Bater o ponto... Enquanto eu trabalho ela dorme... Dorme por que sabe que tem a noite inteira pra curtir... Dorme e diz que me espera... Mas não me prepara o café... Não separa a minha roupa... Nem despede de mim na janela...